quarta-feira, 14 de outubro de 2009

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Era um domingão à tarde. Eu havia abandonado as coisas que estavam por fazer e resolvi tirar uma soneca após o almoço. A invejável siesta, praticada religiosamente em alguns países como México, Espanha e Grécia. Povos sábios, eu diria.

A darling saíra pra ver a mãe levando a cria. Uma bênção. Deitei na minha deliciosa queen-size e coloquei o tapa-olhos, a fim de não ver os fios de claridade que entravam pela veneziana. Os carneirinhos começaram a saltar: um... dois... trêzzzz... Zzzz... O quarto ovino vinha na raia de atletismo em slow-motion ao som de Chariots of fire. Mas o telefone interrompe com aquele pipipipipi irritante. Tocou uma, duas, três... Não tive remédio senão levantar e atender com voz de poucos amigos:

- Alô.

- Oi meu filho - era a avó Xavier - você tá escutando os helicópteros?

- Hum, até estou. Mas tinha conseguido dormir apesar deles. Parecem longe.

- Mas já sabe o que é, né? - a voz da velha tinha um tom de que eu tinha que saber - por isso eu to ligando.

- Não, não sei.

A mulher assume um tom dramático de Datena e dá o fato:

- Roubaram um carro em um bairro próximo. Os ladrões fugiram e a polícia veio atrás. Então entraram em uma travessa do lado da universidade. Mas bateram no muro de uma casa e o carro pifou. Aí pularam o portão de uma casa e tomaram a família como reféns. A polícia está cercando o local. Um pandemônio! Liga na Record.

- Ahn, tá. Vou ver - minha pobre intenção era desligar o telefone e voltar a dormir -.

Mas a velha insiste:

- Ligou? Tá vendo?

- Não mãe, não liguei. Daqui a pouco eu ligo.

- Daqui a pouco coisa nenhuma. Liga agora! O repórter Schlebts tá fazendo a cobertura. Um horror. Ai meu Deus, olha isso!


- Entendi. Bom, eu vou ver lá então. Mas primeiro vou tirar minha soneca.

A dona esbraveja:

- COMO ASSIM??? VOCÊ NÃO QUER VER AGORA? VOCÊ NÃO FICA PREOCUPADO?

- Eu devia ficar?

- Mas você não tem medo?

- Medo do quê, mãe? Minha casa tá trancada. Se pularem o muro eu garanto que porta adentro eles não chegam. Não vivos, pois tenho meus meios pra isso.

- Não acredito que você não queira ver na TV. É aqui perto. Você não quer saber o que está acontecendo?

- Sinceramente? Não.

- Nossa, viu? Eu ligo aí pra dar a notícia e você nem se interessa. Olha, nunca mais te ligo pra dar notícas. Eu aqui preocupada e você nem se incomoda.

- Olha mãe, se for esse tipo de notícia, não precisa.

- Tá bom - o tom agora era de vitimização - nunca mais informo você. Puta merda, viu?

- Tá bom, mãe. Obrigado. Mas prometa.

- Tchau - se despede abrupta -.

Até o momento desta publicação ela realmente cumpriu o prometido. Doravante poderei tirar os meus cochilos dominicais pós-almoço. Sem notícia ruim. Ufa!

2 comentários:

Gerson disse...

Não existe nada melhor para tirar uma mãe do sério do que um filho.
Talvez também não exista nada melhor para acabar com o humor de um filho do que uma mãe.

Unknown disse...

ora..ora...me senti na cena do ocorrido fato dominical,,,,pois conheço a mãe e o filho.....