
Mais do que a brincadeira, resolvo observar a reação dos motoristas. Obviamente há os que recebem os estudantes com cara de mau humor, que é o meu caso, pois detesto essas palhaçadas. Mas há uma parcela grande, se é que não posso dizer a maioria, que procura por moedas no cinzeiro e dá uma singela ajuda para a bebedeira, que é descaradamente anunciada no pedido de esmola. Esse é o ponto-chave que tento refletir. Por que os motoristas são tão receptivos com esses covers de mendigo, enquanto fecham o vidro na cara dos mendigos verdadeiros?
É simples: identidade. Os covers são cheirosinhos, as meninas são gostosinhas, têm ares de mulher desabrochando, bochechas rosadas e cabelos sedosos. Os rapazes exibem dentes bonitos e feições alegres. Ambos se vestem com roupas e tênis bonitos. Então, eles se parecem com nossos filhos, nossos irmãos... se parecem conosco! Os mendigos reais não. Eles fedem, são maltrapilhos, feios, piolhentos, pulguentos e mijados. Para a menina que bateu na janela do carro ao meu lado, o motorista prontamente abriu o vidro e cedeu umas moedas, roçando a mão na mão dela, de forma pausada e safada, enquanto pareceu pronunciar um gracejo. Para os mendigos fedidos, quando eventualmente damos algum trocado é porque não tivemos tempo hábil de fechar o vidro e precisamos nos livrar deles rápido. Ao dar a esmola a estes, fazemos o dinheiro "pingar" nas mãos deles, para que não haja nenhum contágio, principalmente com sua miséria. Não estou defendendo o ato de dar esmola ou não, para quem quer que seja. Isso é pessoal, tanto no que se refere aos covers de mendigo, quanto aos seus originais.
Mas é fato que a solidariedade é seletiva. O nojo e a repulsa também.
Em tempo: Na falta de outra, a foto postada é de um "trote solidário". Consta no jornal que os alunos dessa coletaram dinheiro e doaram à famílias carentes. Somente nesse dia. Nos demais as famílias continuaram carentes e os estudantes foram para o bar.
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