Mas essa espontaneidade e participação, independente dos candidatos em questão, careceu de uma certa concretude. Observando os posts viam-se pessoas aguerridas no teclado mas que, sabidamente, só terão conhecido na vida esse tipo de participação. Atribuo a culpa ao atual processo eleitoral, marcado pela alienação. As eleições eletrônicas, do modo como são feitas hoje, tiraram do cidadão o direito mais amplo e legítimo de manifestar sua indignação. Limitou o descontentamento aos estéreis votos branco, nulo e à abstenção. Quem quer tenha participado da apuração das saudosas cédulas de papel, constatou que o eleitor podia substituir seu voto por impropérios de toda sorte: contra o Governo, contra candidatos e contra o que bem entendesse. Era coisa corriqueira, em uma época em que o anonimato da cédula garantia que o manifestante não sofreria retaliação.
Por trás do avanço tecnológico, a higienização eleitoral também teve outras medidas que tiraram o debate das ruas. Um exemplo foi a proibição da boca-de-urna. A pretexto inclusive da sujeira de papel que fazia - e isso lá é verdade! - uma aguerrida militância foi subtraída das ruas nos dias de eleição. A boca-de-urna tradicionalmente era dividida em dois grupos: de um lado militantes voluntários, que geralmente participavam de organizações de oposição ao regime; de outro os cabos eleitorais pagos, movidos pela necessidade de levar um dinheiro extra para casa. Era uma tremenda oportunidade de dialogar com o eleitor e até mesmo de cooptar pessoas politicamente. Saudável mesmo que às vezes algum tipo de confusão mais acalorada ocorresse. Em dia de eleição não era raro ver, após o horário de almoço, boqueiros pagos abandonarem seus postos em prol de candidatos em que acreditavam, trocando de panfleto a distribuir, a despeito e para desespero dos seus coordenadores, também pagos.

A alienação política de hoje se dá em uma dinâmica na qual o eleitor é chamado apenas a referendar o que um reduzido número de protagonistas determina. Lamento dizer, mas não tem sentido nem valor em si se alguémpensa estar participando de algo, quando está apenas passando procuração. Se você quiser tomar parte, vá a um movimento social ver o que ocorre; auxilie um serviço assistencial e aprenda quais são as suas dificuldades estruturais; experimente visitar um acampamento de pessoas sem moradia ou então acompanhar um movimento de greve por melhores condições de trabalho e salário. Você vai perceber rapidamente que na política não há anjos puros nem demônios absolutos, de nenhum dos lados. Mas também perceberá por quais opções políticas a população organizada pode avançar, em prol de melhores condições de vida, sobretudo para aqueles que mais necessitam, e também quais caminhos propiciam mais justiça social e distribuição de renda.
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