segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Fracasso de quem?


A realidade das escolas públicas é sintomática. Alunos chegando a séries elevadas sem os requisitos mínimos de alfabetização e sem dominar conceitos científicos elementares. Em recente pesquisa do Ibope com a Fundação Victor Civita, intitulada "Perfil dos Diretores de Escola da Rede Pública", foram entrevistados 400 diretores de estabelecimentos públicos de 13 capitais. Dados alarmantes vieram à tona. Não se trata somente do desempenho dos alunos nos exames nacionais, posto esses lamentáveis indicadores já serem do conhecimento do público. Mas finalmente começa a ser estabelecida uma correlação entre o mau desempenho dos estudantes com a má gestão dos estabelecimentos.

Recomendo tirar as crianças da sala. Se você tem estômago fraco não leia o restante. Vamos aos dados:

  • 98% dos diretores não se vêem como responsáveis pelas notas de seu colégio;
  • 90% gastam a maior parte do tempo conferindo a merenda escolar;
  • 64% reconhecem-se não preparados para o ofício;
  • 36% desconhecem a nota de sua própria escola nas classificações oficiais;
  • 21% estão no cargo por indicação de políticos;
  • 50% está há menos de 2 anos no estabelecimento em questão;
  • 5% apenas, chegaram ao cargo por critérios técnicos.

O que esses números não falam de modo explícito é sobre a mentalidade miserável que os fundamenta. A questão do desempenho de uma escola, em linhas gerais, não deveria ser tratada de maneira tão distinta das empresas do universo capitalista. Se sob regime do capital o valor de uma empresa é medido pelo seu lucro, sua participação mercadológica e evolução patrimonial, a escola também pode ser avaliada, considerando que seu dividendo é o capital acumulado na aprendizagem de seus alunos. Isso também é mensurável. Se de fato o objetivo de uma escola é ensinar, não importa tanto qual é a matriz pedagógica adotada, mas sim se podemos avaliá-la através da medição científica da aprendizagem de seus alunos. Assim como uma empresa em declínio, na qual sua liquidez patrimonial desaba e seus passivos ficam a descoberto conduzindo-a à insolvência, também ocorre com a escola. Diferencia-se que o produto de seu trabalho defeituoso é uma multidão de alunos incapazes de ler com comprensão, resolver operações elementares ou demonstrar conhecimentos científicos básicos.

Neste ponto quero estabelecer outro paralelo do desempenho empresarial com o escolar: se na base de um fracasso empresarial podemos encontrar proprietários e gestores incapazes de conduzir os colaboradores ao sucesso econômico é quase certo que, legando alunos com mau desempenho, encontraremos equipes docentes que fracassaram, estas provavelmente (des)governadas por diretores e coordenadores incompetentes ou "apenas" descomprometidos. Infelizmente muitos de nós hão de conhecer coordenadores pedagógicos e diretores incapazes de fazer uma análise conjuntural da clientela de sua escola, desconhecedores dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) e até incompetentes em grau suficiente a ponto de não saber elaborar um plano escolar adequado, com objetivos, metas e estratégias corretamente delineados.

Não pode ser bem sucedida uma navegação sem objetivo, sem metas e sem estratégias que são, respectivamente, o objetivo da empreitada, pontos de checagem e as ações operacionais. Escola sem plano parece-se bem com o dilema de Alice quando pergunta ao Mestre Gato qual o caminho a seguir, mas não sabe dizer aonde quer chegar. A resposta à pergunta mal formulada seria: "Nesse caso tanto faz, basta caminhar bastante." - como bem disse o gato -. Certamente é o que fazem esses diretores de escolas com mau desempenho. Não tendo objetivo, não há caminho, tampouco resultado decente.

Um bom dirigente nomeado para uma dessas escolas precisa compreender politicamente onde é que ela se situa, quais são as características da clientela de seu estabelecimento e o contexto social da comunidade. Tem que buscar a compreensão dos modelos e matrizes escolares que estão na mente de cada docente, para depois provocá-los com indagações a respeito do trabalho e finalidades da escola. Esse dirigente vai repautar e discutir o papel da escola e da docência com suas equipes, embasado pelos PCNs. Tanto melhor será se ele convocar todo o corpo escolar - incluindo docentes, funcionários da infraestrutura, pais e alunos - para debater o problema e traçar planos estratégicos imediatos, que se entrelacem com metas e, por último, com os objetivos cada vez mais amplos. Por fim, precisará avaliar as dificuldades de cada profissional e instrumentalizá-los propondo-lhe acesso a conhecimentos, estudos em grupo e atividades permanentes de formação, recheadas com bons mestres da educação e conhecimentos complementares, nas áreas da Didática, Psicologia e mesmo temas transversais da atualidade. Não é preciso dizer que tudo isso dá trabalho. Bastante.

Só é possível conseguir sucesso em uma empreitada conciliando-se objetivos claros, metas mensuráveis, atividades-meio, recursos materiais e o mais importante: profissionais convictos, orientados e capazes. Claro que uma postura ativa dessas em uma escola pública encadeará outras demandas mais amplas, no âmbito das reivindicações junto ao Estado. E como não dizer que isso também é papel do dirigente educacional?

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