sexta-feira, 30 de janeiro de 2009

Agulhas milagrosas

Fazia dois meses que o tio estava de cama, próximo do estado de moribundo. Na verdade eu pensava em chamar um padre para a extrema-unção e já arriscar fazer as pazes com o deus dos cristãos, pois nada tinha a perder. A dor física me fazia desejar não estar mais encarnado e me livrar da carcaça podre.

Eram meados de 2002. O tio era sócio em um escritório de TI. Um mau jeito, ajuntado com estresse além da conta - e contas bancárias bem rasas -, me debilitaram. Resultado: uma baita inflamação no ciático, de proporções insuportáveis. Não havia posição cômoda pra eu ficar e a avó Xavier cuidava de mim de dia, o que incluía levar-me ao sanitário e me segurar no assento enquanto eu gemia de dores lombares. A darling ia trabalhar e me dava banho à noite. Eu mal e porcamente conseguia dar suporte remoto para o sócio, trabalhando deitado com uma adaptação de bandeja de cama, que acomodava o notebook e o headset do telefone. Uma espécie de kit que me permitia trabalhar deitado entre um urro de dor e outro.

Com as dúzias de consultas e dezenas de radiografias os médicos só engordavam a lista de remédios e mais remédios, cujas contra-indicações superavam dezenas de parágrafos as indicações. Era notório, cada vez que eu ia ao banheiro, que meu fígado estava se esfacelando e parte dele ia embora quando eu dava a descarga. Uma adorável e prestimosa amiga (que não está mais entre nós), vinha me buscar e me levava às consultas, tendo passado até pelo constrangimento de me despir para exames, coisa que me era impossível fazer com autonomia. É quase certo que só por conta desse desprendimento, deve ter arranjado um bom apartamento celestial. Merecido.

Com mais de mil reais de antiinflamatórios, corticóides e injeções desfilando numa sacola, eu estava desenganado. Achei mesmo que ficaria um aleijão com dores pro resto da vida, mas antes disso eu usaria minhas últimas forças pra apanhar meu Rossi quando estivesse sozinho em casa e daria cabo nisso. Não deixaria a darling me sustentar pro resto da vida, tampouco a minha mãe passar a terceira idade cuidando de um marmanjo incapaz. Com certeza não. Um escorpião sabe qual é o seu limite.

Até que um conhecido que morava no ES falando comigo ao telefone me sugeriu a Acupuntura. Desconhecedor total do que quer que fosse o fundamento da terapia das agulhas, eu quase ignorei. Mas com a dor que eu estava eu tentaria até a bispa Sônia, se alguém me levasse. O capixaba não conhecia nenhum profissional em Sampa e resolvi ligar para alguns amigos. Até que um santo homem, um amigo monge budista, me deu o telefone de um tal Dr. Darwin Caldeira Ribeiro. Depois de falar com este, fiz a darling me levar lá na mesma noite. O atencioso terapeuta me disse para ir no mesmo dia a qualquer hora que ele me atenderia em caráter de urgência.

E lá foi a darling atravessar toda Sampa City no horário de rush e escorar o projeto de Quasímodo. Demorei vinte minutos para andar os cinquenta metros que separavam o estacionamento do consultório, que por misericórdia tinha elevador. Depois de me entrevistar e fazer contagens estranhas da minha pulsação segurando os meus punhos, me perguntou o que eu estava tomando. Ao ver o tamanho da sacola, a pilha de receitas e ler alguns nomes o tio Darwin me pediu que abandonasse tudo aquilo, sobretudo umas injeções que, de acordo com alguns profissionais, estavam sendo responsabilizadas até por necrose muscular. Como não resolviam merda nenhuma mesmo e eram caros pra cacete, abandonei a alopatia e entreguei o meu resto quase em putrefação do tio às agulhas do acupunturista.

Depois de duas horas e umas mil e seiscentas agulhadas (não doem nem um pouco) saí de lá andando ereto, o que foi um grande feito. Claro que com resquícios de dor, mas bem menos e com a retidão física digna de alguém pós-Neanderthal. Melhorei sensivelmente na sessão seguinte - três ou quatro dias depois - e na terceira sessão de agulhas EU MESMO FUI SOZINHO E DIRIGINDO! Passei mais alguns meses aos cuidados dele, espaçando as sessões cada vez mais, até ficarem mensais e bimestrais. Então entramos em consenso pela minha alta. Eu gastei uma fração do que teria gasto em remédios, mesmo considerando cruzar a cidade de carro. Mas nascia um novo homem. Tanto que faz uns três ou quatro anos que não passo lá sequer pra dar um abraço no sujeito que me tirou do leito e me restaurou a saúde lombar. Um homem milagroso que enquanto me tratava explicava os fundamentos da Medicina Tradicional Chinesa.

De lá para cá, às vezes senti falta de umas agulhadas para relaxar a musculatura estressada e até para pequenos desajeitos lombares. Mas nunca foram suficientes para me abalar por trinta quilômetros até o consultório onde o dentista Darwin reveza-se entre uma obturação e uma agulhada, correndo como um doido entre uma sala e outra. Sinto saudades dele. Vou ver se crio vergonha na fuça e passo lá pra tomar um chá com o homem que me salvou.

Só que há algumas semanas a darling fez mais uma de suas maravilhosas descobertas. Uma de nossas vizinhas, além de ser bem graciosa (ops!), agradável e simpática é... acupunturista! Resolvi tentar uma sessão com ela que solicitamente veio me atender em casa. Show de bola. Não obstante a pouca experiência da juventude - incomparável com a do sexagenário Darwin - os efeitos da manutenção dela comigo são plenamente satisfatórios. Agora, a cada duas ou três semanas convido a jovem senhora a tomar um suco enquanto me espeta. Serviço eficiente, preço módico, papo culto e simpatia de sobra. Pra quê eu vou querer mais, não é mesmo?

2 comentários:

Carlota disse...

É mesmo sensacional, Tio. Tô fazendo pra minha cervicobraquialgia, e é ótemo! Sem contar que relaxa horrores. Na última consulta, me peguei até sonhando, pode?
E bom saber que você continua entre nós!!!
Beijo!

Fatima Rodrigues disse...

Quando precisar tente www.sinte.com.br, link indicador profissional, preencha o formulário, pois as buscas se baseiam por proximidade de endereço ou cep. A leitura do pulso realizada pelo profissional em questão chama-se pulsologia de Nogier, utilizada não só na Acupuntura, como também na Auriculoterapia e muitas outras. Consiste basicamente na leitura de "sinais" como se fossem "ondas" evidenciando os desequilibrios em ondas reflexológicas. Não confundir com pulsação que mede os batimentos cardíacos; a pulsologia de Nogier atenta-se pela intensidade e não quantidade.
Espero que esteja bem.