segunda-feira, 20 de novembro de 2006

Pedreiros

Os caras são na maioria seres bestiais, que insistem em circular nas comunidades humanas, beneficiados pela sua ilusória aparência de bípedes hominídeos. Isso nos induz ao erro de contratá-los.

Quem nunca passou agonias e tormentos com pedreiros - ou seus correlatos da obra civil - que atire o primeiro torrão de cimento. A não ser que resida em um trailler. Só pode. Porque o tio não conhece um só ser humano que não tenha uma boa e enervante ocorrência para contar a respeito deles. Tendo mudado de casa algumas centenas de vezes, tio Xavier coleciona motivos para sentir vocação para serial killer especializado em pedreiros. Quando estou diante de um pedreiro eu ouço vozes que ficam me repetindo "mate-o... ele é mau..."

Mas pretendo não discorrer sobre minha recente - e ainda corrente experiência - porque neste exato momento estou ouvindo as vozes. Nem sei se o dito tem algum nome, porque ele foi apresentado a mim como "Baxinho" (sem o i mesmo). Baxinho é um ser de estatura inferior à recomendada pela FAO/ONU, oriundo de algum país do nordeste brasileiro e é do tipo faz-tudo. Segundo seu auto-testemunho, que vale tanto quanto uma cédula de três reais, ele só não mexe com aletissidadi. Eu acho isso uma pena. Ao menos a eletricidade seria capaz de castigá-lo pela porquice do seu trabalho eletrocutando-o fatalmente e libertando a humanidade para sempre da existência dele. Como acabaram meus comprimidos de Magnésia Bisurada® falarei tão somente de aspectos gerais e universais desses bípedes.

O orçamento do serviço

Uma ocorrência comum a todos é na visita de orçamento. Todos eles, sem exceção, olham para o imóvel, fingem ouvir a descrição detalhada do objetivo do pobre contratante e chutam o preço. O preço não segue nenhuma lógica mensurável, como tempo de trabalho ou coisa assim. É que na verdade eles não olham para seu imóvel e sim para seus bens duráveis: carro, computador, dvd-player, microondas, secadora, aparelho de som, tudo para ter uma noção de quanto você é capaz de desembolsar. Não sem os habituais comentários de que os serviço é fácil, rápido, já fizeram mais de cem obras como a sua e não demorará mais do que X tempo. Muita atenção para esta variável (X). O que o pobre tomador de serviços não sabe nesse instante, é que a equação para cálculo do tempo real do célvisso pode ser representada matematicamente da seguinte forma:

TR = X³ x 10¹²
Onde:
TR = Tempo real; X é a variável de tempo prometida pelo desgraçado. E se chover no decorrer da obra, pode duplicar o expoente que dá certinho.

O material

Lembremos que a maioria esmagadora desses imbecis é composta de seres incapazes de ler ou escrever o próprio nome. Então lhe pergunto: como é que você confia nos números de necessidade de material proferidos por ele, se envolvem cálculos de metragens quadradas e cúbicas? Te peguei, né? É porque você é tão ou mais idiota do que ele. Então se resigna a aceitar os cálculos dos caras, precisos como um bombardeio da segunda guerra. Da lista de materiais fornecida pelo pedreiro, pode acreditar que:
1) Faltará piso ou azulejo. O montante recomendado não dará nem pro rodapé. E ao procurar comprar mais não achará do mesmo lote tendo que se contentar com tons diferentes.
2) Sobrará argamassa que dará para consertar Itaipú, se vier a rachar.
3) Os "recortezinhos" de piso inutilizarão 70% do material.
4) A pedra, o cimento e a areia excedentes entulharão sua garagem por décadas após a empreitada.
5) 90% das madeiras solicitadas para escoras, andaimes e enchimento de colunas não serão jamais utilizadas. Mas você nunca saberá, porque elas sempre estarão no chão e sujas.
6) O martelo que ele pediu também nunca será usado, porque ele baterá os pregos com seu melhor alicate.
7) As suas chaves de fenda, independente da marca, serão usadas como talhadeiras e ficarão irreconhecíveis.
8) Não acredite na bitola do conduíte que ele vai recomendar. Acredite no tio: em um conduíte de 1/2 polegada não é possível passar dezoito fios de 3mm de seção. Pense nisso.
9) Mesmo que ele alegue mexer com aletissidadi leia as embalagens dos fios e dos aparelhos elétricos que você pretende ligar. Você concluirá que ele entende de fios menos ainda do que de cálculo de piso. E no caso dos fios, o risco será o de incinerar toda a sua família.
10) Se você não tem capacidade para auditar essas merdas de chutes que ele dá no material solicitado, pague um engenheiro ou um arquiteto. Se não puder pagar, procure um amigo com formação técnica ou superior suficiente. Se não tiver nenhum é porque você está mal de amizades. Procure melhorar seu círculo social.

O decorrer da obra

Ele chegará no primeiro dia do trabalho com a cara vemelhona e um bafo de cachaça insuportável. Isto é, se ele comparecer. Imaginando que compareceu, ele lhe pedirá uma grana ao final do dia alegando que não tem para a condução. Procure não dar mais do que dez reais, porque ao menos ele beberá pouco. Quando der os dez reais, finja que não viu a cara feia do oportunista, que achava que ia receber metade do orçamento só pela avant-premiere dele na sua obra.

Se por ventura ele aparecer no segundo dia, não se engane. Ele zarpará, tão logo você saia pra trabalhar. E assim se sucederá por toda a eternidade a que ele condenará você e sua família, ao convívio com areia e cimento. Ao chegar à noite você terá sempre a impressão de que não houve progresso. Na dúvida fotografe logo cedo todos os dias, sempre do mesmo ângulo. Depois de 120 dias, tente fazer uma animação com a seqüência de fotos. O que você verá será uma desanimação. Nem o Macromedia® Flash será capaz de animar aquilo, já que avanços diários de 2cm de massa corrida não são nada comemoráveis. E no fim de cada dia vadiado, o merda sempre pedirá mais um adiantamentozinho. Uma razão muito comum para a ausência prolongada deles na sua obra é o alto índice de mortalidade nas famílias dos pedreiros. É quase certo que todos os dias morra um irmão, primo, pai ou mãe de pedreiro. Conheci um cuja mãe morreu mais de uma vez. Pelos meus cálculos e considerando os óbitos nas famílias dos pedreiros, já não era pra ter nenhum migrante em São Paulo. A não ser que eles estejam mentindo, hipótese que não considero.

Considerações finais

Minha última dica é comportamental. Procure praticar Yôga ou Meditação Zen. Todas as vezes em que chegar do trabalho faça o seguinte: fique ereto, baixe os olhos ao chão, respire fundo pelo nariz, solte o ar vagarosamente pela boca e ande pela casa olhando o infinito, sem firmar os olhos em nenhum ponto. Praticando esse tipo de desapego, você estará no caminho do Nirvana e evitará descarregar seu revólver na cara do filho da puta.

Quer um conselho sincero mesmo? Convença-se de que sua casa está ótima não faça nada nela. Pense assim e você amará mais sua casa, evitando dissabores oriundos das reformas.

Mas espero que o inferno seja bem grande e o Diabo seja bem acolhedor para com todos os pedreiros.

3 comentários:

Anônimo disse...

Olha Má....só sendo entendedido de "aletissidade" como vc para ter energia para tanta criatividade....
vc é "triste"....adorei as sugestões para relaxamento....

Anônimo disse...

Pedreiros? Nããão, tio, o pior de uma obra não são os pedreiros.
No dia que você precisar contratar um encanador saberá do que estou falando.

JRP disse...

Eu contratei um encanador pra desentupir minha eternamente complexa pia da cozinha.
O cara trouxe sua máquina desentupidora, com seu filho de 23 anos a tiracolo.

Sujeira, barulho, pesadelo.

Resultado final: minha canalização está quebrada debaixo do solo e a água está indo para algum lugar além da imaginação.
A mangueira metálica do cara enrolou dentro do cano e quebrou. Pra tira-la, ele abriu o piso do meu quintal.

O entupimento se foi mas gastarei uma nota com reforma da canalização.

É foda, e tudo começou com um entupimento!