segunda-feira, 8 de janeiro de 2007

O dia da marmota

nove horas

Na verdade foi um pouco mais tarde, pois cheguei atrasado só pra variar um pouco. Fico sabendo que a carga do meu cliente, que me esmerei para colocar no agente aéreo sábado de manhã sequer saiu de lá. Somente à tarde ela sairia para Congonhas, para - quem sabe - embarcar à noite para BH, seguindo no dia seguinte para Confins e, desta, em via terrestre para a cidade destino. Meu cliente terá trigêmeos.

dez horas

Toca meu telefone com um prefixo de MG. Não atendo. Não tenho nada para dizer para o cliente. Vou pôr a culpa na Varig?

dez horas mais 30 minutos

Chega um e-mail de outro cliente perguntando sobre a entrega de uma impressora. Não tenho o que dizer para este, porque a distribuidora fica no sul de Minas e foi inundada na sexta-feira. Deixo para respondê-lo amanhã quando eu conseguir dizer algo convincente.

onze horas

Ligo para uma distribuidora de peças para saber sobre quatro míseras pecinhas, essenciais para o conserto de equipamentos de outro cliente. São quatro míseras como eu disse. Tão simplórias que é uma vergonha que não sejam fabricadas no Brasil. Bem, a resposta é que terão que ser importadas e demorarão até quarenta e cinco dias para chegar. Não crio coragem de ligar para esse também.

meio-dia

O dia está um saco só. O extrato bancário da empresa acusa apenas doze reais. Doze reais e está certinho. O número não sai da minha cabeça. Olho o contas a receber e dou-me conta que o próximo recebimento significativo só ocorrerá daqui a dez dias. Penso em suicídio. Evito consultar as contas a pagar e saio para almoçar.

uma da tarde

Volto para minha sala, escovo os dentes e ligo a tevê no noticiário. Na verdade nem presto atenção no conteúdo. Pouco me interessa.

dez para as duas

Vou a um bairro próximo visitar uma empresa de onde me ligaram solicitando visita. Marcada para as 14 horas, chego britanicamente no horário e me anuncio. A recepcionista gerundista disse que estava avisando e a pessoa de contato já ia estar atendendo.

duas e meia

Jogo um cartão de visita na mesa da gerundista e me mando. Porra, se os desgraçados não podiam atender porque não falavam logo? Eu odeio esperar. Na volta passo no banco onde tenho conta pessoa física. Tiro uns trocados para pagar dois credores dos arredores, que não merecem esperar. Quem manda eu almoçar no boteco fiado e colocar o conserto do micro no prego?

três e meia

Depois dos pagamentos entro no escritório. Está uma zona. Não agüento mais aquela baderna. O calor me derrete e o circulador-de-ar-engana-trouxa parece rir de mim com sua ineficiência. Olho pro infinito. Tenho umas dez tarefas para fazer, pelo menos. Mas vontade nenhuma de fazê-las.

quatro da tarde

Abro o scanner e o que encontro nele? O boleto do seguro do carro. Agora me diz: que raios fazia o boleto dentro do scanner? Não tenho com quem brigar, pois trabalho sozinho e só eu mesmo podia ter feito aquela merda. Detalhe que o boleto não podia mais ser pago após 02/01/07. Ligo pro corretor e ele verifica que terei que fazer uma vistoria no carro, para ele obter outro boleto e revalidar meu seguro, que está bloqueado.

cinco da tarde

Fecho o escritório e de saco cheio me mando para passar no posto de vistoria e em seguida buscar minha filha na escola. Sim, ela está na escola em pleno janeiro. A escola infantil é integral e não temos com quem deixar a criança. Na frente do posto de vistoria vejo uma fila com uns dez carros. Odeio fila. Decido fazer a bosta da vistoria somente no dia seguinte.

seis da tarde

Desço a ponte do Tatuapé no acesso para a Marginal. Paro atrás de um carro que aguardava oportunidade para acessar a pista. Ouço um estrondo e meu caro chacoalha tanto que meu cérebro dá boot. Pelo retrovisor vejo a tampa do porta-malas aberta pelo impacto. Checo se minha filha está bem no banco de trás e noto que só está assustada, tanto quanto eu. Atordoado, desço do carro para entender o ocorrido. Só tenho tempo de escutar pneus cantando e um carro quase me atropelando se manda. Percebo que meu sedan virou um modelo hatch. Tarde demais. Não consegui sequer ver o modêlo e a cor do filho da puta. Quanto mais a placa.

seis da tarde mais três minutos

A tampa não fecha, o pára-choque está afundado, o chassi do carro idem. Amarro a tampa com uma cordinha que havia no porta-malas e rumo para a minha casa de onde não devia ter saído hoje. Amanhã verei a real dimensão dos prejuízos e pensarei como me virar para pagar o conserto.

seis da tarde mais vinte minutos

Tentando me refazer do susto, do tranco e da desilusão, pego o celular e ligo para meu primo Eduardo. Edu é funileiro (ou lanterneiro, em carioquês). Conto a desgraça toda e aviso que passarei no trabalho dele pela manhã, para ver o que fazer. Percebo que ele não está entendendo nada. Só então percebo que ao invés de meu primo, eu falava com um cunhado também Eduardo. Não é meu dia. Acho que vou tomar um banho e dormir. Não sem antes tomar uma cachaça. Tenho certeza que amanhã quando o despertador tocar, verei que foi tudo um sonho. E este post não existirá.

Não precisa dizer: eu sou o cocô do cavalo do bandido que foi assassinado pelo xerife.

Nenhum comentário: