segunda-feira, 9 de janeiro de 2006

Morte Ao Emprego Público

Não é que nunca passou pela minha cabeça ser um funcionário público de carreira. Ninguém em sã consciência rejeitaria aposentadoria integral, estabilidade, imunidade e um caminhão de benefício$. Mas a "cultura funcional pública" esta sim é de lascar. Vem carregada com as banhas do sedentarismo dos sujeitos que trabalham em repartições, que colocam os óculos na ponta do nariz para examinar seus documentos e fazem pomp and circunstance ritualístico para bater um simples carimbo no formulário do pobre contribuinte.

O caso que passei hoje foi um pouco pior. Tarde quente, centro da cidade lotado e lá estava eu com o boleto da suada prestação de minha casa em mãos junto com uma dúzia de cédulas de cinqüenta reais. Totalmente disposto e feliz por pagar algo que só será meu em definitivo quando eu estiver no asilo dos velhinhos. Eis que entro na agência da CEF da Rua Boa Vista, ao lado do Metrô São Bento às 14h50m e, ao chegar à temida porta giratória sou abordado por uma jovenzinha, com idade para ser minha filha. O diálogo que segue pode parecer surreal mas é verídico.

- Boa tarde, o que o senhor vai fazer na agência? - Fiquei surpreso. Nem minha mãe me perguntava coisas tão íntimas.
- Eu vou fazer um pagamento. Por que?
- Para pagamentos, o horário já encerrou, senhor.
- Ah é? E vocês trabalham até que horas? Meio-dia?
- Não senhor, mas não tem mais agenda para pagamento.
- Agenda? Olha filha, eu agendo com meu dentista, com meu advogado e com meus clientes. Nunca ouvi falar de agenda para pagar algo no banco.
- Mas é senhor. E não tem mais agenda para hoje.
- Noooossa! A que horas fecha essa joça?
- A agência fecha às dezesseis, senhor, mas...
- Pois olhe! Eu vou entrar e vou pagar essa bosta. Estou com moeda-corrente do país, o boleto está em dia e, por acaso, é dessa merda de banco mesmo. Se não aceitarem eu chamo a polícia.
- Mas senh...

Entro na agência e vou aos caixas. Sentados, lá estavam uma dúzia de cidadãos resignados que tinham cumprido o esdrúxulo ritual de agendamento. Pacientemente esperavam pela chamada do próprio nome gritado pelo caixa. Esperei um pouco pensando como abordar. Chego a um dos caixas e ouço de novo que o absurdo agendamento tinha que ser feito na porta pela mocinha. Custei a acreditar e volto para a pobre-coitada "operadora de agenda bancária":
- Escuta aqui, mocinha. Tem caixas e tem um monte de gente pagando contas. Por favor coloque o meu nome ou me dê uma senha ou faça o que quiser, mas vou pagar esse troço.
- Senhor, não tem mais disponibilidade. Pode ver aqui na tela. São esses quadradinhos. Estão todos preenchidos.
- Filha, eu sou programador. Se eu me sentar aí, em meia hora essa tela terá tantos quadradinhos que quando terminarem de preencher será Natal.
- Sinto muito senhor. Se o Sr. José Carlos estivesse aqui ele poderia ver isso.

Entro bufando na agência. Agora era questão de honra. Ou eu pagava a porcaria do boleto ou ficaria pelado no meio da agência até alguém me atender. Por fim resolvo apelar para uma outra mocinha sentada em um setor, cuja placa não me lembro:
- Moça, são três e meia da tarde. Eu exijo que algum santo ou demônio deste banco receba meu pagamento.
- Olha senhor, não é minha área. Mas talvez aquela senhora ali naquela mesa possa ajudá-lo. É gerente e se chama fulana.
Já na tal mesa e pensando onde penduraria minha camisa e minha calça para o strip-tease resolvo apelar para meus olhos azuis-esverdeados e meu sorriso cafageste:
- Fulana, por gentileza, veja se pode me ajudar: estou com esse pagamento daqui da CEF mesmo e o José Carlos não está lá. É ele quem sempre quebra meus galhos... (uma mentirinha não me condenará ao inferno).
- Pois não senhor, está com o dinheiro em mãos?
- Aqui.
- Um momento. Vou ao caixa e já volto.
....
- Aqui está senhor. Tenha uma boa-tarde.
- A senhorita também. Até mais.

Vão à puta que os pariu! Espero que essa porcaria de banco público também seja logo rifada para capitalistas estrangeiros. CLT neles. Estabilidade, bah!

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