sábado, 3 de fevereiro de 2007

Pesquisa política em MG

A estagiária de jornalismo está dando um duro danado em uma pesquisa de campo. Foi designada para uma pequena cidade do interior de Minas Gerais. Bate palmas à porta da primeira casa, da longa jornada do dia.

[clap clap clap clap]

Um matuto abre só a frestinha da porta, o suficiente pra pôr o olho.

- Bom dia senhor!
- Dia!
- Sou de um instituto de pesquisas e estou fazendo uma qualitativa de opinião. Este é meu crachá. Posso entrar?
- Uai, institu di quê?
- Pesquisa senhor.
- I tem pisquisá logu aqui?
- Não senhor. Vários bairros da cidade estão sendo pesquisados. Eu fui designada para este.
- I num há di tê otras casa?
- Todas vão ser pesquisadas. Comecei por aqui. Então, posso entrar?
- Sei não sinhora.
- Como não sabe, meu senhor? O senhor não é o dono da casa?
- Sô donu di nada não.
- Mas o senhor não mora aqui?
- Moru, mais di aluguel.
- Não importa. Por favor senhor, é um trabalho importante.
- Tindi. Fazê u quê? Intão entra, uai.

Contrariado, o mineiro abre a porta e a moça vai entrando.

- Com licença. A pesquisa é sobre política local.
- Xi. Lá vem cois...
- Qual seu nome, por favor?
- Nomi? Como assim?
- Nome, senhor, seu nome. Preciso preencher no formulário.
- Mais aí ocê vai fazê u quê cum meu nomi?
- Absolutamente nada, senhor. Os dados são sigilosos e não vão jamais ser divulgados, ok?
- Uai, si num vai divurgá intão num há di tê pricisão du meu nome, num é mes?
- Mas senhor...

Nesse momento a garota lembra que precisa visitar mais tantos lares naquele dia e resolve escrever qualquer nome no formulário.

- Muito bem senhor! Vou escrever aqui José da Silva, ok?
- Ocê qui tá dizênu.
- Bem, o senhor acompanha a política daqui da cidade, certo?
- Sei nadinha di pulítica não, môça.
- Como não? O senhor não é daqui?
- Sô não sinhora.
- De onde o senhor é?
- Di otra cidade.
- Sim, mas mora nesta casa há quanto tempo?
- Aqui?
- Sim.
- Nessa casa faiz sêis mêis.
- Então o senhor chegou há pouco tempo na cidade?
- Um tiquim.
- Quanto tempo?
- Uns quinzi anu, achu.
- Ora bolas, então onde o senhor morava antes desta casa?
- Na rua ditráis, uai.

A pesquisadora começa a suar.

- Vamos lá: Em qual candidato o senhor votou para prefeito nas últimas eleições?
- Quandu é qui foi isso?
- Foi no final do ano passado. E o senhor já morava aqui, não é?
- Já disse qui não dona. Eu morava na rua di tráis.

A moça desiste da questão e assinala qualquer coisa.

- Entendo. Então vou para a questão dois. O que o senhor acha da prefeitura daqui?
- Nunca fui lá não.
- Estou perguntando da administração da cidade.
- Qui tem ela?
- Esta página da pesquisa é de satisfação. A administração é boa ou ruim?
- Ah... uns diz qui é boa... otros diz que é ruim.
- E o senhor?
- Qui tem eu?
- O que o senhor diz?
- Digo nada não, dona. Só vô iscutano as prosa dus ôtru.

A estagiária sonha com o dia em que trabalhará em uma redação.

- Pois bem senhor e os vereadores?
- Di ondi?
- Daqui, ora!
- Conteceu arguma coisa cum eles?
- Não, mas em qual vereador o senhor votou na última eleição?
- Sei não.
- Como não sabe? Na sua porta tem um cartaz de um candidato.
- É messss... Qui coisa, dona! Si a sinhora num fala eu num tinha vistu, sô. Vai vê tá aqui dêis di antis di eu mudá e num notei. Inda bem qui a sinhora aviso... Já vô inté mandá tirá... Ô fio, vem cá mais u pai fazê uma cois... Essas criança são fogo dona... Priguiços qui só... Ói um dia dess u minorzim deles, me aprontô uma...
...

Um comentário:

JRP disse...

Jeca Tatu.
Monteiro Lobato.
Ele sabia das coisas.