sábado, 23 de fevereiro de 2008

Railway life - Parte-III: Cajú e Castanha

Em outro dos dias eu tinha uma reunião em um cliente antigo, sito no município de Santo André. Como ele praticamente divide muro com a estação ferroviária e Santo André é um adorável município no qual basta você pensar em ir para receber uma multa em casa, optei novamente pelo transporte suburbano. Tudo bem e em paz na ida, uma vez que a reunião era no final da manhã e fiquei livre da turba proletária amassada.

Mas na volta, uma hora da tarde, embarquei no trem e sentado vejo dois nordestinos de um metro e meio de altura anunciarem-se na ponta do vagão. Claro que meu assento tinha que ser a dois metros das figuras, por razões cármicas. Ambos abrem sacolinhas tiram pandeirinhos de plástico adquiríveis na 25th Street em Sampa por um real e começam o discurso alternando-se em forma de jogral.

[Som de pandeiro em ritmo de repente]
- Nóis pudia tá róbanu.

- Pudia mais num tamu.

- Cum esse tamanho todo

- De menos de metro e meio

- O tiozinho que tá ali

- Istorava nóis co'arreio

- E essa moça bunita

- Parece com a globeleza

- Vai dá uma ajuda pra nóis?

- Vai dá sim tenho certeza

- Nesse trem só tem gente bunita

- Acho que demo sorte

- Cum a ajuda de todos vocêis

- E os trocado que nos dão

- Sustentamu os fio no Norte
Eu fui mais rápido. Quando vi os pandeirinhos saírem das sacolas, troquei rapidamente os óculos pelos escuros. Fiz uma expressão steviewonderiana olhando pro infinito e evitei que eles me fizessem a (des)gentileza de compor algum verso em minha frente esperando um trocado. Eu até pagaria algo, se mediante o pagamento eles concordassem em saltar do trem em movimento e nunca mais encher o saco de ninguém.

Como é proibido tocar som, vender coisas, esmolar e perturbar os passageiros, o que inclui os pé-no-saco dos pregadores evangélicos, os repentistas evaporaram com suas doações e pandeiros, tão logo o trem chegou à estação. Certamente para disfarçar e mudar de vagão ou então esperar outro trem. Se não tivesse quem achasse graça naquilo e ninguém lhes desse dinheiro eles já tinham mudado de "profissão". Fazer o quê? Não tenho culpa de ter os ouvidos apurados.

Um comentário:

Tia Paula disse...

Eu não freqüento os trens metropolitanos, mas convivo bastante com a turminha do "você gosta de poesia?" na rua Augusta. Com esses eu costumo usar o celular. Me faço de ocupadíssima e ai do hippie que me interromper.