Minha casa ficava em uma pequena rua, em formato de "U", que começava e terminava na mesma secundária. Naquela noite saí da avenida principal, entrei nessa secundária e, mal trafeguei dez metros, dei de cara com cavaletes ripas improvisando uma barricada. Um moleque vem à minha janela:
- Tio, não dá pra entrá aqui não. A gente tamo pintano a rua.
- Ah é? E não podia ser durante o dia, já que vocês não trabalham?
- Não dá tio. O cara que traz as tinta chegô tarde.
- Hum...
Minha darling, contemporizadora que é, me sugeriu contornar pelo outro lado. Dei meia-volta, antes que meu saco já na lua me fizesse xingar o pobre garoto. Afinal estava só se divertindo, embalado pelo ufanismo babaca da Copa. Para quem não conhece, os quarteirões no bairro do Mandaqui são disformes, colossais e a região é quase toda morro. Uma voltinha no quarteirão pode demorar cinco minutos de carro. Mas fui. Eis que chego à outra extremidade da tal secundária e me deparo com o quê? Tente adivinhar. Acertou, se pensou em outra barricada! Lá se ia a última possibilidade de um pobre, pacato e cansado trabalhador chegar em sua casa. Dois outros moleques vieram falar com o tio e começaram a explicar tecnicamente questões sobre tinta fresca e tempo de secagem. Foi quando minha involuntária mediunidade - que me isenta de responsabilidade pelo que seguiu - me fez incorporar o "caboclo Carlos Ray Norris Jr.", também conhecido como Chuck Norris.
Norris desceu do carro e com a inconfundível botinada norriana colocou um dos cavaletes em órbita. Começaram os protestos. Os moleques da outra barricada bem que tentaram correr para conter o ímpeto destrutivo mas já era tarde. Com faróis altos, buzinando intermitente e com minha darling apavorada ao lado dele, Chuck Norris já tinha avançado com o meu carro sobre o que sobrou do bloqueio e deixado as trilhas dos Firestone 195 sobre as pinturas da bandeira brasileira, da bola, da taça, do Ronaldinho fenômeno e das putas-que-pariram aqueles moleques de merda. Imagino que a turba juvenil tenha proferido alguns adjetivos indecorosos, mas isso não vem ao caso. Em estado mediúnico, eu não ouvi nada mesmo. Foi Chuck quem ouviu e obviamente estava de bom humor. Caso contrário ele teria engrenado a marcha à ré e grudado a todos no asfalto

Por favor, evitem bloquear ruas nos meus trajetos durante a Copa. Tentarei colaborar publicando os trajetos neste blog com a antecedência que for possível. Não me levem a mal. Eu sou uma boa pessoa, mas sou médium. E Chuck Norris é muito bravo.
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