quinta-feira, 13 de julho de 2006

Tenho culpa eu? Parte I

Sabia-se há décadas que o voraz empobrecimento das massas trabalhadoras, a favelização, a ausência do Estado nas periferias e a inoperância dos serviços públicos - particularmente Educação - empurrava a sociedade para a violência. Desde os governantes militares e seus lacaios civis até um simples trabalhador esclarecido, sabiam que nas décadas de 60 e 70 a ditadura enfiava o país em dívidas monstruosas, produzindo o artificial "milagre econômico". Os mais altos extratos sociais sabiam que, após a festa, vinha uma ressaca civil na década de 80, trazendo desemprego, sucateamento dos serviços sociais e uma inflação jamais vista. E mais: todos esses sabiam que a tolerância com as drogas ilícitas, nas festas da society, construía impérios paralelos no submundo do narcotráfico, dirigidos por neomagnatas, à margem da sociedade oficial. Todos sabiam. Mas o juiz, o deputado, o senador, o empresário e não sei mais quem fingiam não perceber que os narizes e veias vorazes de seus filhinhos e filhinhas queridos - senão os deles mesmos - enriqueciam a bandidagem, cada vez que levavam sua cota de distribuição de renda aos pés do morros, na mão dos aviõezinhos.

Nas décadas de 80 e 90 a burguesia precisava de culpados pela balbúrdia inflacionária, para o desemprego e para a putrefação social. E os incriminados foram exatamente aqueles que se opunham à putrefação: militantes políticos de oposição, sindicalistas, agentes de pastoral e líderes de movimentos populares. Nos editoriais, manchetes de jornal e capas de revista, o que mais se via era: "Foi o PT", "Foi a CUT", "Foi MST", "Foi a CPT". Como a imprensa de um modo geral, a classe média sua consumidora e mesmo grandes representantes das elites nunca foram grandes usuários das suas massas encefálicas, os bordões viraram mantras.

Aos meus míseros dezesseis ou dezessete anos eu já fui culpado pela inflação de 80% ao mês, pelo sumiço da carne nos açougues, pela demissão de milhares de operários e até pelo seqüestro do Abílio Diniz. Eu, o Lula e milhares de militantes, com a diferença que eu continuo resignado a suar pelo sustento da família, pois nunca tive vocação para me aparelhar na política. Bem feito prá mim! Mas durmo em paz e atendo a qualquer um que me telefonar, sem temor nem ressalva. O tio Xavier é um trouxa feliz.

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