sábado, 7 de outubro de 2006

A importância do limbo para a humanidade

Apesar de não poder mais ser considerado um ser humano religioso, o tio Xavier teve uma consistente e profunda formação filosófica e teológica, durante sua juventude até o início da idade adulta. Foi um período rico em experiências de reflexão sobre o Universo, a existência humana, o divino, a mística e sobre a espiritualidade no sentido mais amplo da palavra, de ação concreta e participação social. O grande diferencial da escola teológica que então eu abraçara era justamente a prática da fé. Não estou falando de nada ritualístico tampouco litúrgico embora esses aspectos façam parte. Mas sim de como a fé nos impulsiona no ambiente social.

“Que proveito há, meus irmãos se alguém disser que tem fé e não tiver obras? Porventura essa fé pode salvá-lo? Se um irmão ou uma irmã estiverem nus e tiverem falta de mantimento cotidiano, e algum de vós lhes disser: Ide em paz, aquentai-vos e fartai-vos; e não lhes derdes as coisas necessárias para o corpo, que proveito há nisso? Assim também a fé, se não tiver obras, é morta em si mesma.” (Tiago 2:14-17)


[modo pregação on] O alcance social da verdadeira "obra da fé" é extenso. De nada adianta a piedade espiritual, se não materializar-se socialmente no maior âmbito possível. Se diante da injustiça social, da corrupção, do lôgro, da exploração e da enganação a fé não se manifestar no ambiente social, ela será tão ou mais ineficaz quanto a moeda que se dá no semáforo, para o pedinte. Perceba que a esmola, por si só, também não se enquadra bem no conceito de obra da fé, embora não haja mal absoluto nela. Só que ela não provoca alteração do cenário. Possivelmente e até mesmo por causa da moeda, amanhã o pedinte novamente estará lá.

Pense nisso com profundidade e perceba que também a SUA participação política, a SUA relação com a categoria profissional, a SUA relação com grupos por melhoria dos serviços públicos e coisas assim são ambientes que propiciam manifestações concretas de fé. Exigem ações, no sentido mais religioso da palavra, de reintegração do indivíduo de fé com o mundo à sua volta. Uma espiritualidade piedosa e ritualística divorciada de ações sociais concretas é tão inócua, superficial e falsa quanto egoísta. A fé pode alimentar-se das práticas ritualísticas, mas se manifestará de fato na relação com o outro. O lado endógeno da fé só tem sentido enquanto sustenta e impulsiona as ações do bem social. Fora disso é um grande sino barulhento, vistoso... e oco. Agora, de posse desta reflexão, releia a citação bíblica acima e perceba a implicação social dela. [/modo pregação off]

Entrementes o senhor Joseph Ratzinger, do alto da pompa e circunstância de seu trono - que dizem herdado de Pedro - preocupa-se com a volatilidade da alma e como e onde ela flutuará, caso não tenha cumprindo rituais religiosos prescritos. Estão discutindo ISTO, enquanto uma nova tensão bélica nuclear se aproxima com ações invasivas de potências econômico-militares e de países discordantes da hegemonia. Os cardeais articulam uma preocupação com o destino das almas dos não-batizados, ao mesmo tempo em que centenas de seres inocentes são massacrados no Iraque invadido. Concentram-se em definir se o limbo é um lugar ou não, enquanto a maior parte da África torna-se cada vez mais um não-lugar, sem sua fatia de participação e dividendo na nova economia mundial. Eu diria que isto é semelhante a passarmos pela rua, vermos alguém espancando uma vovozinha de oitenta anos e darmos de ombro, dizendo o conhecido "não é comigo". Imparcialidade não existe.

Tire suas próprias conclusões.

Um comentário:

Anônimo disse...

"Imparcialidade não existe."
É verdade.
Não sabes do prazer com o qual li este teu "post"...(é assim que fala?)
E já que imparcialidade não existe, já te falei, e falo de novo...você é um menino de Deus. Aquele mesmo que outrora você conheceu e pelo qual militou e muito.
Fé, querido, fé...
De fato, ela não é imparcial e muito menos nossas atitudes decorrentes dessas.
(Se achares conveniente, deleta meu comentário.)
Beijucos.