sábado, 21 de outubro de 2006

V de vingança

Tempos atrás, estava eu no meu escritório, quando lembrei de uma chamada telefônica que tinha que fazer. Lembrando o número anotei em um post-it, colei no monitor e disquei. Atendeu-me um cara mal humorado como nunca vi:
- Que é? - estranhei porque ela morava sozinha.
- Bom dia! Poderia falar com a fulana?
O cara bufou e desligou. Como pode haver alguém tão grosso? Então procurei na minha agenda o número correto da amiga e liguei. Eu tinha invertido os dois últimos algarismos. Depois de falar com minha amiga, vi o número errado. Decidi ligar de novo. Quando a mesma pessoa atendeu eu falei:
- Você é um filho da puta, viu?
Desliguei imediatamente, destaquei o post-it e anotei ao lado do número as iniciais: FDP. Colei de novo no monitor e o elegi meu desafogo de raiva. Toda vez que eu estava estressado, ligava pra ele e xingava. Isso me fazia sentir realmente muito melhor. Ocorre que na época a Telefônica estava lançando o serviço "Detecta" de identificação de chamadas. Achei que teria mesmo que parar de ligar para o filho da puta. Então, tive uma idéia. Liguei para ele, mudei o tom de voz e disse:
- Boa tarde, aqui é da Telefônica. Estou ligando para saber se o senhor conhece o nosso serviço "Detecta".
- Não interessa! - disse o grosso, desligando na minha cara. O cara era mesmo mal-educado. Rapidamente, disquei novamente:
- Alô!
- É por isso que você é um filho da puta! - e desliguei rapidinho rindo que só eu.
Aqui vale até uma sugestão: se existe algo que realmente está lhe incomodando, você sempre pode fazer alguma coisa para se sentir melhor: eleja uma vítima e diga para ele o que ele realmente é. E pronucie filho da puta com a boca bem cheia. Faz um bem danado.

Dias depois fui ao shopping. Estacionamento lotado como sempre. Vi um carro com a luz de ré acesa e parei para ocupar a vaga. Era uma tiazinha de uns 128 anos e fez quatrocentas manobras para tirar o carro da vaga. Depois das intermináveis balizas ela saiu e engrenei para manobrar meu carro. Do nada, apareceu um Vectra preto vindo na mão oposta e entrou com tudo na vaga que eu estava esperando. Comecei a tocar a buzina e a gritei:
- Ô meu chapa! Eu estava aqui primeiro!
Em vão. O fulano do Vectra simplesmente desceu do carro, fechou a porta, ativou o alarme e caminhou no sentido do shopping, se fazendo de surdo. Comecei a olhar se haviam câmeras de vigilância, planejando a depredação do carro dele. Foi aí que percebi que o carro tinha um aviso de vende-se no vidro, com um número de telefone fixo. Então, respirei fundo, anotei o número e fui embora do shopping.

Dias depois o tio estava sentado no escritório. Acabava de desligar o telefone, após ligar para meu amigo filho da puta, como fazia todos os dias. Eis que lembrei do telefone do Vectra. Adivinhe o que fiz?
- Alô?
- Por favor, é daí que estão vendendo um Vectra preto?
- Sim.
- Eu anotei o telefone no trânsito e gostaria de marcar para ver de perto.
O desavisado devia estar desesperado pra vender e lascou o endereço da casa:
- Sim amigo, eu moro na Rua Bzvitchz 527, na Lapa. É uma casa amarela.
- Legal! Qual é o seu nome amigão?
- Meu nome é Rzvotznicks Schwartz*.
- Em que hora é melhor eu marcar contigo?
- Dia de semana à noite. Nos finais de semana eu quase não saio. Quer vir amanhã?
- É o seguinte Rzvotznicks, posso te dizer uma coisa?
- Claro, amigo.
- Rzvotznicks, você é um grande filho da puta. Filho da puta mesmo! Viado! Corno! - e bati o telefone às gargalhadas, quase vingado.
Anotei cuidadosamente o telefone de minha nova vítima. Agora eu tinha dois filhos da puta para ligar. Só que após mais algumas ligações alternadas aos dois filhos da puta, a coisa foi perdendo a graça. Fiquei pensando em como incrementar a sacanagem e tive uma idéia. Liguei para o filho da puta 1. O cara, mal-educado como sempre, atendeu:
- Alô!
- Você é um Filho da puta - mas desta vez não desliguei.
- Ainda está aí, desgraçado? Não vai desligar seu cuzão?
- Siiimmmmmmmm, amorrrrrr!!! - respondi rindo.
- Liga pra puta da sua mãe - disse ele, irritadíssimo.
- Nããããão filho-da-putinha queridoooooo.
- Fala teu nome, lazarento! - berrou ele, descontrolado!
Eu, com voz séria de quem também está bravo, respondi:
- É o seguinte xará: meu nome é Rzvotznicks Schwartz*, seu filho da puta. Por que? Vai me pegar?
- Fala onde você mora se for homem, que eu vou aí te pegar, desgraçado! - esbravejou.
- Você acha que eu tenho medo de um filho da puta? Anota aí viado: Rua Bzvitchz 527, na Lapa quer que eu repita? Rua Bzvitchz 527, na Lapa. Uma casa amarela. Tem um Vectra preto na garagem, seu palhaço filho da puta. E agora, vai fazer o quê seu trouxa?
- Eu vou até aí agora mesmo, cara. Começa a rezar, porque você tá morto seu puto!
- Uuiii! É mesmo? Ai que meda! Seu bosta! Vou te esperar na porta - e desliguei o telefone na cara dele.
Aí liguei para o filho da puta 2. Ele mesmo atendeu:
- Alô?
- Olá, grande filho da puta - sou eu de novo, lembra?
- Cara, se eu te encontrar vou...
- Vai o quê? O que você vai fazer, sua bicha arrombada?
- Vou chutar a sua boca até estourar todos os seus dentes!
- Acha que eu tenho medo de você, filho da puta? Vou te dar uma grande oportunidade de tentar chutar minha boca, pois estou indo para tua casa agora! Vou arrebentar sua cara e pôr fogo nessa merda de Vectra. E depois vou pôr fogo nessa casa amarelinha de bicha. Me espera na porta, seu trouxa.
Aí eu saí rapidinho e fui até um orelhão. Liguei pro 190. Falei com uma voz afetada e chorosa, que estava indo pra casa do meu namorado Rua Bzvitchz 527, na Lapa e ia matar ele porque me traiu, que eu odiava ele e mais duas ou três bobagens. Desliguei rapidinho antes que me localizassem. Liguei em seguida pro jornal Notícias Populares - que já não existe mais - e fiz um drama, avisando que tinha um babadaço de duas bichas se matando na minha vizinhança, na Rua Bzvitchz 527, na Lapa. Peguei meu carro e zarpei pra lá também.

Foi a coisa mais divertida que já fiz em toda minha vida. Ver dois marmanjos se esmurrando e indo presos enquanto o fotógrafo do Notícias Populares se esbaldava com a cena. Melhor ainda foi abrir o jornaleco no dia seguinte e ver a notícia no alto da página com uma chamada enorme: "Bichas ciumentas quase se matam na Lapa" e as fotos dos dois trouxas algemados com as caras estouradas.

Moral da história: Sei lá... Não sacaneie com o tio Xavier.

* Essa história e todos os demais dados citados são fictícios e adaptados de outras que já recebi algumas vezes. O tio Xavier não tem um pingo de tempo pra ficar azarando no telefone com quem quer que seja. Mas que seria divertido, seria. Aliás... eu tenho o telefone de um filho da puta que bem que merece. Boa idéia.

Um comentário:

katia disse...

dio santo mio...to ficando com dores no maxilar de tanto rir...será que consigo ir até o fim da página sem que eu tenha que ser levada as pressas pro p.s com uma crise de riso???
bj