quinta-feira, 3 de agosto de 2006

O pára-quedista

Vejam só. Você nunca o viu. Se mal o viu, foi como um cara comum. Estava no bar bebendo, em uma rodinha de amigos na calçada, olhando o traseiro da mulher gostosa que passava ou contando vantagem. Às vezes trabalhando, uniformizado ou não. Enfim um sujeito absolutamente comum.

Você nunca o viu fazendo um abaixo-assinado pelo asfaltamento de uma rua esquecida, nem se reunido com os habitantes do bairro para discutir segurança, nem trabalhando como voluntário em algum serviço social, nem coletando agasalhos pra campanha, nem mesmo plantando uma árvore em uma praça pública. Todas as ações em que você o viu, se não eram inócuas, eram em benefício próprio. Quiçá em benefício da própria família, como extensão de si próprio.

Mas eis que agora ele aparece para você com um imenso sorriso nos lábios, peito estufado, gel no cabelo puxado para trás e barba feitinha. De uma sacola ele saca uns "santinhos" e folhetos e, orgulhoso de si, te pergunta como se fosse a coisa mais óbvia do mundo:

- Cê já tá sabendo que eu sou candidato, né?
- Candidato?
- Sim, deputado!
- Ahn... Por qual partido?
- Pelo PXYZ.
- Hum... Mas você já era filiado desse partido antes?
- Que nada! Me filiei faz uns meses, mas a tempo do prazo mínimo para homologar a minha candidatura.
- Certo. Mas esse PXYZ tem assim, um programa?
- O programa vai passar na TV no mês que vem.
- Não, eu falo assim de uma linha política, um histórico de atuação, uma bandeira.
- Bandeira tem sim. Os caras do partido me deram e tá lá no meu carro, mas nem uso. Vou mandar fazer uma com a minha foto. Quem me indicou esse partido foi o primo do meu vizinho. Ele me falou que, como é pequeno, tenho boas chances de me eleger com poucos votos. Vamo vê né? Eu conheço tanta gente no meu trabalho, na faculdade e no futebol de salão.
- Certo. E qual é a sua plataforma?
- Plataforma? Eu montei um comitê. Vai ser no salão do antigo bar do Júlio, lembra? O pai dele me emprestou e não está me cobrando nada.
- ...
- Bom, posso contar com você né meu amigão? (tapinhas nas costas)
- ...
- Toma aqui esses santinhos e esses folhetos. Viu minha foto? Você conhece bastante gente e pode conseguir uns votos pra nos ajudar né?
- ...
- Falou, véio! Distribui aí pros seus conhecidos. Ah, e fala pra sua mulher distribuir lá no trabalho dela, por favor. Toma mais esses aqui. To indo nessa que tenho um compromisso de campanha.
- ...

[folhetos indo pro lixo]

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