quinta-feira, 7 de setembro de 2006

Vá ao Cabral... Mas não me chame.

Bem, depois de ter adiado por diversas vezes a ida a uma festa do programa Energia na Véia, o tio criou vergonha e comprou com um dia de antecedência os ingressos necessários. Para quem não conhece, o programa radiofônico vai ao ar todas as manhãs em Sampa City pela rádio 97,7Fm. Como o nome sugere, a programação é de flashbacks dançantes, particularmente dos anos 70, 80 e 90. Sendo um tio, aprecio deveras o programa e o ouço praticamente todas as manhãs. E, volta e meia, eles inventam uma festa "revival-alguma-coisa".

O calvário do casal de tios começou quando fizemos um reconhecimento dos arredores para verificar a existência de estacionamentos. Nada feito. Na porta do Cabral ostentavam o tradicional e estelionatário luminoso Vallet Park. Por meros dez reais prometiam estacionar os carros "com seguro" (entre aspas mesmo). Detalhe: o pseudo-estacionamento era uma rua erma situada entre casa e um cemitério. Os carros eram estacionados em cima das calçadas. Haviam dois estacionamentos de fato mas eram minúsculos pátios oriundos de lojas de carros desativadas. Claramente não eram capazes de amontoar mais do que cinqüenta carros cada uma. A relativa proximidade da casa com o Metrô Tatuapé, somada à ausência de estacionamentos no local, sugere que de fato seja mais freqüentada por pessoas sem carro.

Como a festa em questão parece ter mobilizado um público fartamente motorizado, em pouco tempo os carros lotaram tanto a rua de trás, quanto os minúsculos arremedos de estacionamento. Os canteiros ajardinados passaram a ser vendidos pelos flanelinhas por déirreau, no dialeto flanelês. Para os trouxas que se dispuseram a aceitar a extorsão e ainda cometer a infração de estacionar sobre o canteiro (vide o art 182, VI do Código de Trânsito), havia uma surpresa em papel amarelo, em cada um dos párabrisas distribuída panfletada pela CET. De brinde, na saída policiais armaram um bloqueio e fiscalizaram os documentos dos infratores, de modo que a apreensão deve ter sido praticada no atacado. O tio se resignou a estacionar corretamente do lado oposto da enorme avenida Salim Maluf, atravessando à pé e fora da faixa as dez ou mais pistas semi-expressas, mas sobreviveu incólume. Pela vaga na praça, cedi a um achaque menos agressivo resolvido com meros três reais (adiantados) pela "olhada" do flanelinha. Traduza-se "olhada" como não-depredação do meu veículo, pois é claro que o meliante não estava lá quando busquei o carro.

Desta vez o tema era Toco, Contramão e Overnight Revival, na onda dos malhados revivals atuais. Os dj´s convidados foram outrora residentes das respectivas casas. Tenho particular admiração por Iraí Campos, que discotecou nos anos 80 e 90 na Toco, na zona leste da capital paulista. Freqüentei a Toco e algumas correlatas com assiduidade religiosa e aprendi a curtir os gêneros funk* e house bem como os programas de rádio, nos quais Iraí esbanja seus flashbacks até hoje. Infelizmente, como nada é como a gente quer, justamente o Iraí discotecou das 21 às 00h30 e o casal tio e tia chegou após isso. Perdemos.

Mas vamos ao tema. O Cabral não é nem de longe o que podemos chamar de uma fantástica casa noturna. Reza uma lenda inca que teria surgido pelas mãos empreendedoras de Luciano Huck (geralmente com dinheiro alheio) e que, mal a casa bombou, ele vendeu sua cotinha e zarpou. A decoração e iluminação sugerem algo bem legal, mas talvez esta estivesse sendo mal operada. Mantinham uma intensa claridade, que minimizava o efeito dos piscantes e canhões. A sinalização interna também deixa a desejar e transforma a tour em uma aventura rumo ao desconhecido. Aparentemente há uma única chapelaria que ainda acha-se no direito de cobrar cinco reais por objeto. Talvez até guardássemos algum, não fosse a fila de trezentas pessoas. O ar condicionado é tão mal distribuído que uma caminhada de dois metros pode variar a temperatura entre uma sauna a vapor e um túnel de congelamento frigorífico. Muito ruim mesmo. Os serviços de bar não foram testados porque com a casa lotada mal dava pra saber onde ficavam os ditos. Dos banheiros também passamos longe.

A única coisa mais ostensiva e eficaz me pareceu ser a segurança interna. Os leões de chácara de 2,2m com 132Kg cada um eram numerosos e ficavam de antena ligada, se bem que não vi nenhum indício de confusão aparente. Não sei se isso é da mesma forma nos habituais eventos axesísticos, funkeiros e pagodísticos da casa, embora eu desconfie que não, por razões sociológicas.

Na pista de 70´s e 80´s, durante o tempo em que ficamos lá, o dj fez uma salada musical que soou meio estranha. Não creio que Katia Flavia de Fausto Fawcett e Planet Rock de Soul Sonic Force façam um bom par no mesmo set e muito menos que possam ser seguidas por "Twist and shout". Já na pista de 90´s o som e as viradas eram melhorzinhos mas por volta de duas da manhã um dj bastante apegado ao seu gosto se orientou pela parada de sucessos pessoal, em detrimento de músicas realmente conhecidas. O resultado se percebeu na redução visível do chacoalhamento de esqueletos. Enfim, por volta das três e pouco da madrugada, o tio e a tia darling resolveram dar linha na pipa.

Well, pelo conjunto da obra, 0 Cabral não me pareceu digno de bis. Ao menos para o meu senso mínimo de qualidade.

* Atenção: o funk a que me refiro de modo algum tem a ver com o lixo podre e pornográfico desenvolvido nos morros cariocas. Para saber mais leia ISTO AQUI na Wikipedia.

Um comentário:

Gabriela Martins disse...

Que susto! Por um instante pensei que i tio tivesse dado uma passadinha no Cabral´s, boteco copo sujo que fica em frente à UFMG (e onde dou as caras pelo menos uma vez por semana).