domingo, 16 de dezembro de 2007

Balelas de amor (Shits of relationship)

Fernanda* é uma menina adorável. Sorridente, meiga e até bonitinha. Enfim, atributos de uma pessoa de quem é quase impossível não gostar. Dona Lola*, sua mãe, a trata com um misto de gata borralheira de dia mas princesa à noite. Conheço a Fernandinha desde os tenros seis anos. A criatura era daquele tipo de criança "vira-lata", no bom-sentido da expressão. Adorava dormir na casa dos outros e o fez por dezenas de vezes na casa do tio Xavier. Ela vinha toda manhosa durante as reuniões de famílias de amigos e me perguntava se podia ir dormir na nossa casa. Ao consentimento óbvio, ela corria vender outro peixe para os pais dizendo que nós a tínhamos convidado. Golpe tão manjado quanto aceito por todos. E lá ia a espevitada dormir e passar o dia seguinte na casa da gente.

Espevitada é um bom adjetivo para uma garota que já dava mostras de libido realçada, desde a mais tenra idade. Não é preciso ser psicólogo ou terapeuta para perceber certas coisas em uma criança. Mas isso é da natureza de cada um. Cabe aos pais e demais adultos do convívio saber lidar, para que isso não se sobreponha aos demais aspectos importantes da maturação.

Ocorre que Fernanda - segundo contou ao tio - teria perdido a virgindade aos malfeitos quatorze anos. Nada para se espantar. De mim ela ouviu sempre os alertas para tomar cuidados com a saúde do corpo, com o coraçãozinho e, sobretudo, com a segurança pessoal. Aqui começa um capítulo à parte de Fernandinha. Fogosa como sempre demonstrou-se, a danada é daquelas que não perde por nada uma oportunidade sexual. Dentre as peripécias colecionadas, algumas são de fazer corar até ao adulto mais supostamente liberal. Assumo parte de minha caretice, pois ainda penso que transar em escadaria de emergência de shopping center não seja algo muito convencional. Ainda mais de caso pensado, quando se vai de mini-saia com planos e metas arquitetados. Algumas das broncas que Fernanda levou do tio dizem respeito a artes mais inseguras, como trepar em um parque verde em plenas duas e meia da madrugada. Cheguei a ser ríspido com ela, pois nesse caso falta-lhe a noção das infortúnias possibilidades que enredam uma situação dessas.

Fernandinha tem um currículo sexual invejável até para os mais letrados. Está bem, saudável e assegura ter curtido até agora cada um dos momentos de maluquice. Hoje com dezenove anos, Fê já é uma mulherzinha feita, trabalha, entrou na faculdade (agora então ninguém segura!) e já alça seu ingresso gradual no mundo adulto. Coleciona alguns relacionamentos de namoro mais estáveis. Traduza-se: com duração de meses e não-exclusivos. O mais recente resultou em um pretenso noivado. Não consigo entender rituais humanos como os noivados, dada a fugacidade dos relacionamentos. Estamos em tempo de "namoridos", "ficantes" e um leque de modelos afetivo-relacionais que os estudiosos jamais imaginaram. No meu ver, o evento nubente-circense só existiu por obra, pretensão e assanhamento da D. Lola, esta que mais parece realizar suas fantasias na filha do que qualquer outra coisa. Acredita o leitor que, logo depois do início desse namoro, a D. Lola esteve na casa da minha irmã e contou vertendo baldes de lágrimas que a casta cria tinha perdido a virgindade com o garoto em questão? Juro! O que não é possível é como a dita senhora pode lacrimejar por um hímen rompido há mais de quatro verões. Ou a mãe devia estar na fila do transplante de córnea ou é uma hipócrita assumida e pensa que os convivas são idiotas como ela.

Meio idiota, uma jovem de dezoito anos e um meninão de pouco mais, ambos sem nenhuma perspectiva profissional sólida, adotarem laços que insinuam falsamente um pré-matrimônio. Festa com dezenas de convidados, som, luzes, bolo com noivinhos e troca de alianças. Tirando a festa em si, até que bem servida de comes e bebes e tirando a boa discotecagem - esta a cargo do tio - o resto foi pastelão elevado à décima potência. Eu ri à beça com os arremedos de formalidade, discursos, dedicatórias, até com a inócua troca de alianças. A noivinha, danada que só, ria todo o tempo causando a impressão de que o fazia por causa da presepada em si. Qualquer dia desses perguntarei na lata.

O noivo, um meninão aparentemente bonzinho, estudioso e trabalhador, certamente não tinha a menor noção de com quem estava a namorar e então noivar, relativamente ao voluptoso - e ainda crescente - currículo sexual da nubente. Tadinho. Segundo a noivinha, o rapaz era "mó parado", têrmo depreciativo proferido a mim, o qual desconfio referir-se a coisas como sua inaptidão para peripécias sexuais e seu desprezo por baladas e noitadas dançantes. Curiosamente por tudo que ela mais preza. Já falei dezenas de vezes a ela para achar um par com o mesmo pique, caso queira um relacionamento mais duradouro.

Saldo do teatro: poucos meses depois, quem sabe alertado por alguém ou quiçá por sinapse, o noivinho deu linha na pipa. Primeiro pediu o tradicional tempo para, depois de poucos dias, dar um au revoir por telefone mesmo. Mas e a festa, alianças e presentes? Danem-se. Como reza o protocolo, os presentes enxovalescos do noivado são dote da noiva. Então, ela que não me venha com um repeteco teatral esperando recorrência de mimos. Se convidado, comparecerei à nova festa e até discotecarei de novo com prazer. Mas respaldado pelo jogo lençóis que eu e a tia já demos naquele primeiro de talvez tantos noivados, pouco importando com quem ela vá usá-lo.

Esses humanos são cômicos.

* * * Em tempo: Fernandinha me disse há cinco minutos pelo Msn que está de "ficante" novo. Mas que também anda saindo com um cara casado. E que ambos são bons de cama, rs... * * *

2 comentários:

JRP disse...

Fala a verdade, tio: esse pessoal não passa de um bando de bonobos bem vestidos.

Tia Paula disse...

Muitas vezes nem bem vestidos...